O fascínio da robótica
ENTUSIASMO – Jovens em disputa internacional de construção de robôs: estímulo pedagógico – SESI/Divulgação
Duas instituições brasileiras, reconhecidas internacionalmente, têm sido pioneiras no esforço de melhorar a educação no país e aproximar o Brasil das boas práticas internacionais: o Serviço Social da Indústria (SESI), com mais de 400 escolas e 270 000 alunos (da educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e Educação de Jovens e Adultos – EJA), e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), com mais de 520 unidades operacionais e 465 unidades móveis para ensino técnico e profissional.
Em comum, elas têm o uso de tecnologias educacionais e metodologias inovadoras como parte do seu DNA, foco nas áreas de STEAM (Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes/Design e Matemática) e orientação para o mundo do trabalho. Materiais pedagógicos autorais e exclusivos, infraestrutura de excelência, e quadro técnico atualizado – professores e instrutores que passam por formação continuada – são outros diferenciais.
Dentro da proposta de valorizar a cultura de conhecimento aplicado, também chamada de mão na massa (maker), o SESI tem se tornado referência no uso da robótica educacional. Atualmente, quase 200 000 alunos da rede são beneficiados com as atividades, que começaram a ser adotadas em sala de aula em 2006. O SESI também organiza torneios desde 2012, abertos para estudantes de outras redes de ensino.
Parceira da organização sem fins lucrativos FIRST (For Inspiration and Recognition of Science and Technology), a instituição é responsável pela operação, no Brasil, das competições FIRST LEGO League Challenge (FLL) e FIRST Tech Challenge (FTC). Além de participar do projeto educacional da Fórmula 1, F1 in Schools, e ter estudantes competindo na FIRST Robotics Competition – categoria mais avançada para estudantes do ensino médio. Já passaram por essas competições mais de 30 000 estudantes, que também representaram o Brasil em torneios internacionais e levaram mais de 60 prêmios.
A prática e as competições de robótica são uma importante ferramenta de ensino. Os estudantes são desafiados a pesquisar, com metodologia científica, e apresentar soluções para problemas reais na temática da temporada, como a produção de lixo, a qualidade de vida dos idosos e as cidades inteligentes, e a construir, programar e manusear robôs.
Competidores afirmam que a experiência foi essencial para a sua vida estudantil, pessoal e profissional ao proporcionar desenvolvimento socioeducacional. Pais e docentes concordam que aproxima os estudantes da ciência e da tecnologia e estimula as soft skills, como raciocínio lógico, trabalho em equipe, criatividade e comunicação.
Na temporada 2020/2021 dos torneios nacionais de robótica, encerrada em julho, foi possível constatar as valiosas lições de um grupo que, movido pela paixão em tecnologia e educação, superou as dificuldades e surpreendeu com o bom desempenho. São as equipes de garagem, de Organizações Não Governamentais (ONGs) e escolas públicas.
TRADIÇÃO – Estudante em torneio no Uruguai: uma década de competições FIRST no Brasil – Mauricio Zina/SOPA Images/LightRocket/Getty Images
Na etapa regional do FIRST LEGO League Challenge (FLL) – modalidade para alunos de 9 a 17 anos com robôs feitos de peças de lego –, das 424 equipes inscritas, 41 eram de escolas públicas e oito de ONGs ou de garagem. Dessas, classificaram-se para o torneio nacional, dois times de escolas públicas, um de ONG e quatro de garagem.
Já na modalidade dos robôs maiores, de até 19kg, o FIRST Tech Challenge (FTC), das 35 equipes inscritas no Festival SESI de Robótica, uma é de escola pública: a Sanja Storm, da EE Prof. Alceu Maynard Araújo, em São José dos Campos (SP). O colégio já tem uma equipe na FIRST Robotics Competition (FRC), competição internacional de robôs gigantes, que chegam a 54 kg, mas essa foi a estreia no FTC.
Encontro de gerações
Apesar da ligação com a escola, o projeto é aberto a jovens de toda a região onde ela se localiza, o que dificultou ainda mais os encontros da equipe, formada por sete integrantes. “O treinamento para fazer o robô, a elaboração do projeto, foi tudo virtual. Só na hora de montar que nos encontramos. Como era nossa estreia, tivemos que aprender as novas regras, correr atrás dos componentes, fabricar chassi. Os alunos projetaram e fabricaram o robô com apoio de patrocinadores, para corte da chapa e dobraduras, por exemplo”, conta o técnico Ricardo Akio Iamamoto.
Aos 62 anos, sendo 34 dedicados à Embraer, onde exerceu a função de engenheiro aeronáutico, Iamamoto virou voluntário do projeto há seis anos com um empurrãozinho da esposa, coordenadora pedagógica do colégio.
Desde então, a troca de experiências com a nova geração tem sido um aprendizado constante. Segundo o engenheiro aposentado, práticas e termos tão distantes da sala de aula, como cronograma de projeto, acompanhamento e análise de risco acabam despertando o interesse e entrando para a rotina dos estudantes.
“A gente aprende a conversar com eles. A idade pega um pouquinho, mas conseguimos instigá-los. Eles fazem uma pergunta, eu devolvo com outra, ajudo eles a pensar, a buscar soluções. Trazemos um pouco do trabalho na indústria, o processo de desenvolvimento de um produto, como tomar uma decisão. Cada um tem uma ideia e acha que é melhor, então como canalizar isso?”, reflete Iamamoto.
A missão de democratizar a robótica
Apesar das diferenças em relação aos técnicos mais experientes, Igor dos Anjos da Silva Santos, 17 anos, teve o mesmo desafio: engajar e garantir a união dos estudantes sem as aulas presenciais. Ex-aluno do SESI em Candeias (BA), ele foi técnico destaque na competição regional da Bahia do FLL, à frente da Black Gold, equipe de garagem formada por seis integrantes, em sua maioria, colegas da Escola Estadual Ouro Negro.
“Estudei no SESI entre 2015 e 2017, lá tive meu primeiro contato com a robótica. A professora de português tinha conversado com a minha mãe que eu era muito ansioso e precisava de uma atividade para usar a criatividade”, lembra. De anjo a competidor e técnico, já são seis anos dedicados aos torneios.
“Fui para a escola pública no ensino médio e vi a necessidade de ter a robótica ali. Os alunos também precisam ter esse aprendizado. Fundamos a equipe com intuito de democratizar a robótica entre as escolas públicas do município”, explica o mais jovem técnico do FLL, Igor dos Anjos.
O SESI apadrinhou o time, doando a mesa da arena e o tapete das missões, além de maletas LEGO. O grupo também conseguiu apoio da Secretaria Estadual de Educação, que concedeu notebooks para os alunos. E a prefeitura disponibilizou a biblioteca municipal para a gravação dos vídeos submetidos à organização do torneio. Todo o esforço valeu a pena e a equipe ficou em segundo lugar no regional, classificando-se para o nacional.
Apoio para equipamentos
Outro time que conquistou o segundo lugar no regional – neste caso, do Rio Grande do Sul (RS) – contando com a paixão de ex-competidores foi a Lobóticos. No início da temporada, três ex-alunos da Escola Municipal Heitor Villa Lobos, em Porto Alegre, que hoje estudam no 1o ano do ensino médio no Instituto Federal da Restinga (IFRS) entraram em contato com a técnica Cristiane Pelisolli Cabral, animados para competir.
O colégio tem certa tradição nos torneios, mas, neste ano, havia a dificuldade de fechar equipe. Com o incentivo dos veteranos, eles conseguiram se inscrever com três representantes do IFRS e quatro do colégio municipal. O tapete, onde o robô cumpre suas missões, também foi cedido pelo SESI. Eles contam que tiveram apenas quatro dias para montar o robô – período em que o estado saiu da bandeira preta.
Para começar e manter uma equipe nas competições, sejam elas regionais, nacionais ou internacionais, os competidores buscam diferentes formas de apoio, incluindo patrocínio de empresas e incentivos dos governos municipais e estaduais. Técnico e fundador da Doctors Machines, do Colégio Estadual Padre Cláudio Morelli, em Curitiba (PR), o professor de matemática Thadeu Angelo Miqueletto lembra que, no início, em 2016, eles esbarraram num problema comum aos iniciantes, o investimento.
“Mas a vontade de colocar o projeto em prática foi maior, então surgiu a ideia de montar rifa com ajuda da comunidade e pedir ajuda financeira de uma empresa particular da região, a Mili. Assim nasceu a Doctors Machines. Tudo que conquistamos foi com a ajuda da comunidade e da direção escolar”, orgulha-se o técnico Thadeu Miqueletto.
A equipe compete desde a temporada 2016/2017 e, neste ano, contou com a participação de nove integrantes. Eles também ocuparam o pódio – 2º lugar – no regional do Paraná.
Um histórico de evoluções
DESENVOLVIMENTO – Jovens em disputa: preparação para que se tornem líderes inovadores – Mauricio Zina/SOPA Images/LightRocket/Getty Images
Lançada em setembro do ano passado, a temporada 2021/2022 das competições First Lego League Challenge (FLL) e First Tech Challenge (FTC) marca a celebração de 10 anos de realização das competições de robótica pela instituição no Brasil.
A Senior Solutions, realizada em 2012/2013, foi a primeira participação do SESI Nacional nas competições FLL no país, em cooperação com EDACON, Instituto Aprender Fazendo (IAF) e SESI São Paulo. Na final, o torneio contou com cerca de 600 competidores, distribuídos em 60 equipes de 11 estados. Nessa edição, os estudantes apresentaram inovações para melhorar a qualidade de vida dos idosos, a partir de soluções para problemas de acesso e locomoção.
Na temporada seguinte, Nature’s Fury, o SESI mobilizou cerca de 2.200 competidores, em 367 equipes. Em comparação com a temporada anterior, esses números mostram um crescimento de 266% em participação de estudantes na competição.
Ao passar dos anos, mais e mais estudantes começaram a participar dos Torneios de Robótica FLL. O resultado disso é uma década de muitos aprendizados, competição saudável (mais conhecida como Gracious Professionalism) e marcada pela cooperação entre equipes e competidores, a famosa Coopertition.
O torneio de robótica FLL foi criado e é realizado, em nível global, pela organização sem fins lucrativos For Inspiration and Recognition of Science and Technology (FIRST). A modalidade é destinada a jovens de 9 a 16 anos, de escolas públicas, privadas e da rede SESI. Os estudantes integram equipes de dois a dez pessoas e são supervisionadas por dois adultos. Eles devem construir e programar robôs LEGO para cumprir uma série de missões. Além disso, as equipes precisam trabalhar em sintonia tendo como base os valores: respeito, ganho mútuo e competição amigável, dentre outros.
Na 10ª temporada da FLL, a partir do tema Cargo Connect, os competidores irão explorar o futuro do transporte, desde o envio de pacotes em áreas rurais e urbanas até a entrega para ajuda em desastres e trânsito aéreo de alta tecnologia.
Já a modalidade FTC, adotará o tema Freight Frenzy. Na temporada, as equipes irão repensar inovações de transporte mais rápidas, mais confiáveis, inclusivas e sustentáveis que melhor conectem as comunidades e economias em todo o mundo.
Ao incentivar os participantes do FTC a pensar sobre a sustentabilidade do transporte no futuro, o SESI os prepara para serem a próxima geração de líderes inovadores, enfrentando os desafios mais difíceis do mundo.